No início eram apenas 13 mulheres. Elas nem se conheciam, mas se aproximaram porque tinham em comum o gosto pelo bordado. Depois de 14 encontros, elas se tornaram amigas e ‘bordadeiras de memórias’. Agora, o resultado do projeto Memórias Bordadas é aberto ao público em uma exposição itinerante que começa pela Praça CEU, no bairro Ouro Verde, onde elas se encontravam semanalmente para ouvir história, resgatar lembranças e bordar memórias. A produção vai percorrer, ainda, o Museu do Imigrante, a Feira do Livro de Bento Gonçalves e o Centro Cultural Tuiuty.
Quem visita a exposição se depara com uma produção coletiva de 12 estandartes bordados, um de cada mulher participante. Além disso, um livro único coletivo com 60 trabalhos autorais, cinco bordados de cada uma das mulheres, completa a mostra, acompanhada por um vídeo que eterniza os momentos do projeto. Desenvolvido para proporcionar às mulheres uma oportunidade de reflexão sobre suas vidas, a partir de mediações literárias, o projeto ganha vida com o bordado que coloca no tecido as aspirações e experiências das envolvidas. Feito à mão e com o coração, o bordado trouxe a elas uma ferramenta da transformação social e do empoderamento feminino. A arte também é uma maneira de proteger a herança cultural ao mesmo tempo em que capacita para uma atividade que pode gerar renda digna e segura, desenvolvendo o empreendedorismo.
Entendendo o projeto
A cada encontro, novas reflexões a partir das leituras trouxeram à tona memórias significativas para cada uma delas, que foram compartilhadas numa roda de conversa enquanto faziam o trabalho manual. Selecionadas entre 30 inscritas, estas mulheres, com idades entre 23 e 70 anos, têm diferentes ocupações, o que gerou uma troca ainda mais rica em torno das experiências que cada uma tinha a compartilhar. Tem professora, secretária, higienizadora, cuidadoras de idosos, aposentadas e donas de casa. São mulheres com neuro divergência, necessidades especiais, de diferentes raças, religiões e idades. Nem todas são de Bento Gonçalves, com procedências de outras cidades gaúchas como Nova Prata e Santa Rosa, além do estado do Pará e até do Haiti.
Cada mulher recebeu um exemplar de cada livro selecionado para a contação de histórias. Ao todo, foram utilizadas seis obras literárias, totalizando 107 exemplares. O registro de cada encontro e das memórias que o processo despertou foi tecido socialmente, através das linhas e agulhas em uma prosa de afeto. Como resultado, a exposição Memórias Bordadas.
A proponente do projeto é a Neiva Morello Michelin, que também foi mediadora literária e instrutora de bordado. A equipe conta, ainda, com a participação da produtora cultural Eunice Pigozzo, da bordadeira Deise Ceccagno e da assistente de produção Daíze Correa Figueredo. O projeto foi financiado pelo Fundo Municipal de Cultura de Bento Gonçalves. As ações estão sendo compartilhadas pelo Instagram @projetomemoriasbordadas.
PROGRAMAÇÃO DA EXPOSIÇÃO
Praça CEU – 05 a 16 setembro
Centro Cultural Tuiuty – 17 a 30 setembro
Feira do Livro de Bento Gonçalves – 10 a 20 de outubro
Museu do Imigrante – 05 a 11 de novembro
AS BORDADEIRAS E SEUS ESTANDARTES
- Adrielle Carmargo Bedin e Eloísa de F. Camargo – Meu refúgio
- Alvina Camerini Gargioni – A minha vida
- Angela Maria de Toni Bissolotti – Memórias EntreLaçadas
- Cardinale Amador de Miranda – Uma nova conquista
- Cleusa Maria dos Santos – A caminho da escola
- Ertha Vilna Felisma – A minha Pátria
- Iludi Civardi de Lima – Amor de vó
- Inês de Fátima dos Santos – Meus pequenos corações
- Lurdes Cys – Minha juventude
- Marivane Cenci – Equilíbrio. Feito à mão e com o coração
- Roseli Martins – Damília. Onde a vida começa
- Wandirlei Terezinha Machado Charão – Amor pelo meu chão e minha gente
AS MEMÓRIAS
- Adrielle: Aos 23 anos, incentivada pela mãe Eloísa, deu seus primeiros passos no mundo do bordado sem experiência prévia. Cada desenho que surgia no tecido trazia felicidade e realização a essa jovem artista.
- Alvina: Aos 69 anos e apaixonada pela costura, já era uma artista do tricô e crochê. Ao conhecer o bordado através do projeto, encontrou uma nova forma de brincar com os tecidos, ampliando seu amor pela criação.
- Angela: Aos 34 anos, a professora e artesã diz que o Projeto Memórias Bordadas proporcionou recordar memórias significativas enquanto criou outras, junto das colegas. Estas memórias afetivas estão expressas em cada ponto, em cada história ouvida e contada, nos livros e na vida.
- Cardinale: 51 anos e paraense de origem, iniciou sua jornada no bordado através do projeto. Sua relação com a linha e a agulha é antiga, mas foi neste novo espaço que se aventurou por técnicas artísticas que nunca havia explorado antes.
- Cleusa: Aos 65 anos, sempre teve a companhia do tricô e crochê em sua vida. O projeto a apresentou ao bordado livre, onde não apenas criou novas amizades, mas também reinventou sua forma de trabalhar com linhas e agulhas.
- Eloísa: Aos 67 anos, teve que interromper seu contato com o bordado durante a gravidez. Hoje, ela revive essa paixão ao lado da filha, unindo gerações em um laço ainda mais forte através da arte.
- Ertha: aos 37 anos, é mãe de duas filhas e vive um estável matrimônio. Haitiana e formada em secretariado, seu primeiro contato com o bordado foi breve, mas ao adentrar no projeto, floresceu em uma nova paixão.
- Iludi: Aos 68 anos, sempre teve o ato de costurar como um carinho. Com o projeto, redescobriu memórias adormecidas e se conectou ainda mais com seu passado, fazendo do bordado uma extensão de sua história.
- Inês: Aos 54 anos e viúva, natural de Iraí e residente em Bento Gonçalves há quatro anos, sempre teve afinidade com o crochê. Encontrou no projeto uma chance única de expandir sua mente e aproveitar o tempo livre de forma criativa e gratificante.
- Lurdes Cys: Aos 71 anos, tinha um amor antigo pelo bordado que precisou ser deixado de lado por conta do trabalho. Retomar essa prática com o projeto foi uma oportunidade de escapar da rotina e redescobrir novas maneiras de viver e se realizar.
- Marivane: Aos 51 anos, carrega consigo a chama da arte desde os cinco anos. Ao descobrir o projeto, se deixou envolver pelo bordado livre, transformando essa prática em uma alegria duradoura que a acompanhará por toda a vida.
- Roseli: Aos 47 anos, é uma sonhadora que sempre observou sua avó bordando. Agora, ao refletir sobre suas memórias nas mediações literárias dos encontros, decidiu que quer aperfeiçoar-se na técnica para ensinar à próxima geração, como uma forma de herança a sua família.
- Wandirley: com 71 anos, tem uma paixão por projetos artísticos e pelo desenvolvimento pessoal. Já se envolveu com teatro, dança e outras atividades similares. Ao descobrir o novo projeto, ficou encantado com a experiência, que não só lhe ensinou a bordar, mas também proporcionou crescimento pessoal através da leitura e da troca com as colegas, que se tornaram grandes amigas.
Foto: Helio Obregon dos Santos